Declaração do Ambiente

"O homem tem direito a viver num ambiente cuja qualidade lhe permita viver com dignidade e bem-estar, cabendo-lhe o dever solene de proteger e melhorar o ambiente para as gerações actuais e vindouras." 1972

Mundaka-Hossegor

"Indeed, every great surf trip - like every great story - needs a conflict. The journey and destination, the bitter and the sweet. The walk through the desert to the oasis in the sand. A villain to the hero."

5 Galapinhos
6 Aveiro
7 Aveiro
8 Aveiro Costa Nova
9 Aveiro Barra-Areão
10 Espanha Bilbau
11 Espanha Bilbau-Mundaka
12 Espanha San Sebastian
13 França Biarritz
14 França Hossegor
15 Viagem Aveiro
16 Lisboa

Noite de chuva

Recomeço. 
Lisboa, noite de chuva
esvoaçando ao vento, leve.
De volta à casa na cidade.
Lá fora na estrada molhada,
vai marcando o tempo a passagem do autocarro.
Portugal este país de pernas para o mar.

Arquitectura

Faculdade de arquitectura, palácio da Ajuda, o rio. Encontro-a, bonita, simples, inteligente. Já não a via há meses, ao ver-me quase grita o meu nome, João! Fala bem espanhol, conta a todo o auditório as suas primeias impressões do México. Lê poesia de uma forma tão natural. Derreto-me a ouvi-la. Na sessão de perguntas, ensaio uma intervenção precipitada e desconexa. No final da sessão, vexado, tento despedir-me rapidamente.
Sou observado clinicamente pelo professor. Não comunico bem com a amiga. Está lá o suposto namorado que eu tento acreditar ser só amigo, em negação. Despeço-me atabalhoadamente na direcção de um cigarro.
A casa era o tema da apresentação. A casa como ser vivo, como parte da natureza.
Segui para Rio Maior, para a serra esventrada de pedreiras e flechada de eólicas, como setas gigantes. Talvez tenhas razão, eu só destruo. Prepara-se a detonação. Estendo fios e cabos, testo o circuito. Não funciona, o tempo urge, entro em stress, pela terceira vez neste dia. Mas resolvo o problema, estilo Robert Jordan do Hemingway.
Chego a casa arrasado. Declino o convite para beber um copo com ela, a amiga e o namorado. 

Balanço

Balanço, balancete
Há um ano estava na merda
Hoje estou melhor
Acabei por arranjar trabalho.

Lisboa, ponte Vasco da Gama
Ao atravessar o Tejo observo
É quase um mar
Com vento, ondas e espuma
Prateado, azul e verde
Conforme o sol, as marés, o tempo.

Chego à outra margem
Demorou quase um ano.

SBSR

20.30 Bloc Party
21.30 Rhye
22.00 Iggy Pop
22.00 Capitão Fausto
22.50 Mac de Marco
23.50 Massive Attack

Faz sentido

Faz sentido esta paragem que fiz. Pelo menos neste momento está a fazer. Costumo pensar que de forma geral conseguimos o que queremos ou quisemos. Pode nunca ser exactamente como imaginámos ou no tempo que queríamos. De qualquer forma parece que sempre que concretizamos o nosso objectivo, já estamos a sonhar com outro.
Quando comecei a pensar em regressar para Portugal imaginava o surf, a família, os amigos, viajar pela Europa, o curso de Inglês, escrever o relatório para a ordem dos engenheiros sobre o projecto de Nacala. Encontrar uma namorada.
Parece que ainda não consegui tudo o que imaginei, mas será que é o que quero mesmo? Olhando por uma perspectiva maior, esta paragem profissional está a ser importante para decidr qual o rumo que vou tomar. Em primeiro lugar, se contiuo o caminho da prospecção mineira ou explosivos. O caminho do desmonte de rocha parece abrir mais portas no futuro. Em segundo lugar, trabalhar em África ou noutro lugar qualquer. Europa, América do Sul, Portugal?

Interrail

29/04 Lisboa - Genéve
30/04 Genéve - Salzburg
1/05 Salzburg - Praga
2/05 Praga - Krakow
4/05 Krakow - Oswiecim
4/05 Oswiecim - Viena
5/05 Viena - Ljubljana
11/05 Trieste - Veneza
12/05 Veneza - Firenze
13/05 Firenze - Rome

Pensamentos em comboios:

Onde é a tua casa?
Hitler não conseguia entrar na Suiça por causa dos Alpes
As posições funcionais de um grupo de amigos
Animais rodeados de humanos na plage de paquis, Genebra.
As caricatas situações num hostel à noite
Pudor ou vergonha na red light district
Cabo de selfies
Gerir momentos de stress
O passageiro desastrado
Crescimento económico vs estabilidade económica
The Doors - Night Train
A floresta europeia e a savana africana
Na Alemanha a paisagem repete-se.

Polónia.
Anoitece lentamente.
O suave por vezes súbito balançar
da velha carruagem leva-me a Cracóvia
Dois trabalhadores polacos atrás de mim bebem e falam embriagados, mas calmos. 
O mais velho tem a voz destruída pelo álcool de muitos anos
O mais novo fala mais alto e larga um Ah de satisfação após mais uma golpada na garrafa.
Fábricas monumentais, escuras, de vidros partidos, equilibram-se na sua própria ruína.
Desceu a noite entretanto.

Lisboa Inverno

Lisboa, Inverno. Estou de volta a Portugal, a casa, ao ponto de partida. Voltei para trás, ou fechei um ciclo. O que me espera agora. Futuro Incerto.

Praia do Tofo, Inhambane

Quatro anos fora de casa. 4 anos de África. Alguma coisa devo ter aprendido.
Confirmo o que já sabia. A felicidade é uma soma de momentos dispersos, a tristeza também. Uma não existe sem a outra. As duas, reparo agora, são do género feminino. O amor está em toda a parte, não interessa se é branco, preto, mulato, indiano, asiático. Existem depois alguns constrangimentos a uma relação multirracial, criados por nós mesmos. Se quisermos podemos ultrapassá-los como o fazemos com outros obstáculos. O amor verdadeiro e recíproco é muito difícil de encontrar. Encontrei-o uma, duas vezes talvez, nos meus 30 anos de vida.
Profissionalmente podemos chegar longe, ou talvez não. É preciso sorte, é preciso estar no sítio certo à hora certa. É preciso gostarem de nós, não ser apenas competente. Foram 5 anos, os primeiros da minha carreira, entusiasmantes, compensadores. Sinto-me realizado nesse aspecto. Empresa de grande dimensão, projectos de exploração mineira em África, construção de caminho de ferro, desmonte de rocha e montanhas, computadores e modelos geológicos, liderança, isolamento, desafios.
Escrevo hoje de Moçambique, Praia do Tofo, Inhambane.
Escrevo do sítio onde queria estar, desde há um ano para cá. Do local e na data precisa, 4 anos de África completam-se dia 2 de Novembro. É o fecho de um ciclo.
Este momento, este sítio, esta data, apresentam-se para mim de forma supreendemente natural. Tudo parece fazer sentido agora. Sem grandes inquietações aceito o destino que tracei e o rumo novo que estou a tomar.
Escrevo do Tofinho, ondas verde turquesa, ordeiras mas violentas a quebrarem nas lajes pontiagudas e cortantes para onde eram lançados os subversivos do regime colonial. Mesmo que soubessem nadar, não creio que sobrevivessem ao buraco para onde eram lançados no Tofinho.
Nasci num país  numa época boa. Tive sorte, nasci bem de saúde, bonitinho em miúdo, mais baixinho de altura, estou agora a ficar careca e peludo, os anos de vaidade estão a acabar. Há que aceitar. Novos desafios me esperam apesar da boa sorte que tenho tido. O tempo e a vida continuam para mim...

Joanesburgo

Manhã de domingo clara, amena. Caminho lentamente pelo passeio, fumo, penso. Bebi demasiado a noite passada, vomitei sozinho no quarto de hotel, adormeci exausto.
Apesar da ressaca e dor de cabeça a manhã é leve de tristeza e preocupação. O trabalho é para ser feito, o amor perder-se-á no tempo lentamente como uma nuvem azul de chuva que desapareceu, não vimos para onde, e deu lugar ao sol e à lucidez, à rotina de mais uma quotidiana ilusão.
Ela tentou ligar-me esta manhã, talvez pela ressaca, o coração não acelerou, não parou, manteve-se apático, tranquilo e quase a esqueceu.

Zalewa

Da janela do avião via-se verde, vegetação rasteira, algumas palhotas, telhados de palha castanhas. Tirei o casaco antes de aterrar, camisa oxford, e soube-me bem o calor, a brisa quente, o cheiro diferente. Dois de Novembro de 2011, Malawi. Vinha trabalhar para África, prospecção mineira, mas não sabia mais nada além disto. Tudo era novo e desconhecido e esse vazio sabia bem. A aventura tinha começado. O aeroporto era pequeno, mas amplo, sentia-se que se podia caminhar pela pista. Sentia-me livre e preparado, liberto do passado, a viver o presente e entusiasmado com o futuro. Este sentimento ficou bem marcado. Fui feliz em África.
Julho de 2015, à noite, depois do jantar na cantina do estaleiro, mais de mil noites parecidas com esta, manhãs, meios dias, pôres do sol. Fumo um cigarro na noite, a nuvem que sobe dos meus pulmões sobe lentamente em direcção às estrelas, caminho lentamente entre os dormitórios e a rede de arame farpado do estaleiro e quase que me sinto bem outra vez com a minha solidão.
O vazio branco, o compartimento do quarto, do escritório, da minha vida, sou indiferente à cor, às pessoas, aos conhecidos, aos colegas, aos amigos, à família, à paixão. Nada interessa, eu sou nada, interesso a quem neste estado? Perdi contigo, continuo a perder, em rota descendente vertiginosa, iludo-me por vezes ainda com um plano de vida que me parece inatingível neste momento, longínquo, impossível.
Desafiei as leis da vida, das relações, tentei traçar um caminho egoísta, só meu e cheguei a um beco sem saída. Não tenho força para trepar o muro à minha frente. É tão alto e eu sou tão baixo, e a idade já não me permite saltar tão alto como dantes. Resta-me voltar para trás, cruzar-me de novo com todas as minhas ilusões, e verificar agora que não passaram disso, não existem mesmo, são um passado que já todos esqueceram, eu próprio as tento esquecer porque já não acredito nelas. Cruzar-me de novo com todos os que me viram subir sozinho a pirâmide, que nem de pedra era, era de vidro, percebo agora, e volto para trás e tenho que encarar todos os que me viram confiante, excessivamente simpático, lunático, maluco, com as minhas estórias inoportunas e pouco credíveis, inconvenientes. Vêem-me a afastar-me perdido, fraco, e sentêm-se mal também por mim, e perdem a coragem de me falar, quase como eu, que perdi a coragem totalmente.
Não sei estar comigo, não sei escrever, não sei ouvir música, não sei estar com outros, resta-me esperar, ficar sozinho no meu mundinho, dormir, comer, trabalhar, o que conseguir, manter-me à tona neste lago de lama castanha.
Felizmente o Ribeiro electricista tem bom gosto musical. escusava é de estar a passar neste momento o Black Magic Woman. As festas nas traseiras do meu quarto fazem-me companhia nestes sábados solitários no estaleiro onde me entrego à aceitação da minha insignificância e desejos de aventura em África. Apenas tenho dias de trabalho e noites de descanso e conversa via whatspp com a família. Leio os meus livros, vejo os meus filmes, alguns livros de trabalho e durmo. A minha vida amorosa acabou neste campo, em África. Já tive que chegue. Todas diferentes, todas maravilhosas, mas todas temporárias.
Manhã de domingo. O sol sobe no céu e dá uma nitidez limpa ao estaleiro e às montanhas a oeste. O que é importante na vida, na minha vida? A Luisinha, o António, o Francisco, a mãe, o pai, eu. Fazer o que está ao meu alcance para que estejam bem. Estar a trabalhar fora do país faz com que estejam bem? Faz sentido continuar a trabalhar fora? Sim para poder comprar uma casa? Para trabalhar na área que gosto? Para poder ir de férias e passar um bom tempo com eles? Serei feliz em Portugal depois de 4 anos a trabalhar em Africa?
Talvez não, talvez sim, só saberei se tentar. Participar em mais um projecto. Sair bem se possível. Trabalhar para isso. Com disciplina e e dedicação a esse objectivo. Família, trabalho, rumo a algo mais, que virá por sorte e acaso. E estarei preparado nesse momento talvez. Amigos, amor, felicidade, tristeza, força, fraqueza, sorte, azar.

Life in the village

Diariamente percorro as estradas de terra batida em mau estado que dão acesso aos diferente pontos da obra. Pelo caminho, geralmente absorto pelas preocupações do trabalho, desperto a atenção para observar certos momentos e cenários que compõem a realidade do Malawi, principalmente desta zona mais rural e remota. As pessoas vivem de forma simples vivendo do que cultivam, milho para fazer a nsima, a base da sua alimentação, alguns vegetais e meia dúzia de galinhas. Também possuem cabras e alguns até vacas que pastam guiadas por miúdos pequenos. Durante o dia vejo-os entretidos a ver os carros passar e as máquinas a trabalhar enquanto roem cana de açúcar ou o caroço de uma manga. As famílias são numerosas, vê-se muitas crianças, não há electricidade, de noite a única luz é a da fogueira e das estrelas. Às oito da manhã começa a escola e muitos percorrem longas distâncias a pé pelas estradas em numerosos grupos, outros sozinhos de caderno velho e sujo na mão. Ao domingo vão à igreja, cantam e tocam instrumentos artesanais e dançam. Bebem cerveja caseira e celebram o fim de semana unidos em família.


Apesar das ruínas

Apesar das ruínas e da morte,
Onde sempre acabou cada ilusão,
A força dos meus sonhos é tão forte,
Que de tudo renasce a exaltação
E nunca as minhas mãos ficam vazias.

Sophia de Mello Breyner Andersen

Nacala Railway Project


Mwanza Campsite - Nacala Railway Project 2013
Sábado, entardecer, céu em chamas,
sair finalmente do campo,
atravessar rios e buracos, lamas,
mais de 2 horas de estrada até poder ver,
as luzes da cidade africana, a derreter.
Jantar, e depois para quem fique,
e eu ficava sempre,
os colegas tornam-se amigos,
mais uma rodada de gin tonic.
Malawi, Moçambique,
sons e cheiros de África,
Entranha-se aos poucos esta terra estranha.
Enfim, a madrugada,
torna-se então unânime a retirada.
 
Domingo, na cama, deixar a manha passar,
duche, café e jornal,
então e que tal?
Vamos para a esplanada.
O que vai desejar?
Deixar a tarde passar.
Reset.
Jantar calmo em boa mesa,
Em Portugal está-se melhor,
Mas não foi mau o fim de semana,
está na hora de voltar para o verde, o calor e a lama.

Segunda-feira, clima abafado e quente,
não corre brisa,
derrete-se o aço.
Dozers, dumpers e giratórias,
os encarregados contam aquelas mesmas histórias,
passagens hidráulicas e terraplenagem
escavação, furação e desmonte.
Rasga-se a montanha antiga, intacta e selvagem,
passam bandos de macacos.
Sirene, que vem aí explosão,
águias, pássaros e pedras pelo ar,
mulheres e crianças espantadas a celebrar.
Momentos que não se esquece,
mas com tanto trabalho e sem tempo para o mar,
também o homem esmorece,
e escreve para ver se arrefece.